Lord Voldemort é um bruxo das
trevas, habituado a tudo que há de mais perverso. Assim, é curioso que aquilo
que ele mais tema seja justamente morrer.
Essencialmente, todas as atitudes do vilão (e seu desejo por poder) estão ligadas
à sua completa obsessão em suplantar a condição mortal. Para tal, inclusive, ele
acaba recorrendo à própria morte como arma. Ele mata para fragmentar sua alma,
em busca da imortalidade. Mata um casal, cujo bebê lhe representava uma ameaça.
E mata para controlar a Varinha das Varinhas – também chamada “Varinha da Morte”. Morte, morte e morte mais uma
vez. Se há um tema central em Harry Potter,
este não é a magia.
Em dado momento do filme Harry Potter e a Pedra Filosofal, o
jovem Harry encara, pela primeira vez – e graças a um espelho mágico -, os
rostos dos pais que ele jamais conhecera. Sua história, inclusive, começa
alguns anos antes disso, quando ele se torna célebre ao sobreviver à temível
Maldição da Morte, na mesma noite em que fica órfão.
O tema “morte” surge em Harry Potter ilustrado das mais variadas
formas. No âmbito literal, já somos introduzidos na saga do menino bruxo com a
notícia do homicídio do casal Potter e com o tema da orfandade. Mais tarde, nos
deparamos com a morte de um amigo e com a perda repentina de Sirius Black,
padrinho do protagonista. Até mesmo a eutanásia do professor Dumbledore é mais
que apenas sugerida em certo ponto. Nos dois últimos filmes, a fatalidade atinge
os dois lados da batalha, tornando-se ainda mais incessante, e o sacrifício final
de Harry, como último recurso para derrotar o vilão, ainda faz rima com aquele enfrentado pelos seus pais para salvá-lo.
Todos os signos encontrados nos
filmes da franquia são, obviamente, oriundos dos livros nos quais são baseados.
Por isso mesmo, é realmente recompensador para o leitor encontrá-los na tela,
transcritos de maneira tão bem feita e atenciosa aos detalhes, já que a morte
também se manifesta de maneira simbólica: Dumbledore (personagem de Sir Michael
Gambon) surge usualmente representado num figurino de tons de roxo, que, assim
como o verde do Avada Kedavra, é uma
cor normalmente atribuída à morte. A figura de capuz e foice, aliás,
praticamente ganha forma em Harry Potter
e as Relíquias da Morte – Parte 1, na
passagem em que, numa animação impecável, Hermione narra o Conto dos Três
Irmãos (fábula que, claramente, trata da busca humana em refrear a mortalidade
e as dores decorrentes da mesma).
Em tempos em que a morte e o
genocídio nas batalhas de blockbusters passam quase que despercebidos, em Harry Potter e as Relíquias da Morte - Parte 2 há um momento em que
as perdas são encaradas, para serem então sentidas e refletidas. Coisa
aparentemente esquecida em filmes como Superman
- Homem de Aço, Círculo de Fogo e
toda a franquia Transformers, onde
verdadeiras hecatombes são provocadas e as milhares de vidas perdidas sequer
são mencionadas, o que traz uma dose muita alta de artificialidade a um clímax
que, supostamente, deveria ter algum peso dramático.
Lord Voldemort, cujo nome em francês significa "Voo da Morte" (querendo dizer algo como "Escape/Fuga da Morte"), tem estampado em seu rosto ofídico o resultado de uma vida tentando renegar esta característica tão intrínseca à humanidade. Harry Potter, em suma, é uma série que nos impreciona e impacta com uma mensagem sobre a finitude da vida, e de como a concepção desta realidade (chorada e aproveitada do jeito certo e com as pessoas certas) é o que nos faz tão humanos.
Em memória de Jailson Xavier. Nem tão fã de Harry Potter, mas apaixonado pela Emma Watson. Primo, amigo, irmão.
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