Fiat Lux!

No período do Oscar do ano passado tive a curiosidade de entender como eram avaliadas as categorias técnicas como Fotografia, Mixagem de Som, Edição de Som, Efeitos Especiais... e o que cada uma representava. No meio dessa minha pesquisa encontrei o livro “50 anos luz, câmera e ação” de Edgar Moura (que por sinal trabalhou em Cabra Marcado Para Morrer um dos filmes do tema desse mês), e essa profissão acabou me fascinando em todos os sentidos, desde a parte técnica à parte artística. Resumirei um pouco do que absorvi desse livro.

Primeiro de tudo devemos entender o que é fotografia. Como o nome já diz: foto (luz) grafia (escrever), escrever com a luz, a fotografia envolve duas áreas que por muitos são consideradas opostas, a arte e a ciência, pois através das técnicas e equipamentos eles criam essas belas imagens que engrandecem os filmes. E para escrever com a luz o que é importante para fotografia saber sobre ela? Que a luz varia em relação a sua natureza (dura ou difusa), intensidade e direção (direita/esquerda, atrás/a frente, acima/abaixo – em relação à câmera).

Como dentro da indústria do cinema muitas vezes as funções se fundem, é comum acontecer algumas confusões do que se espera de um diretor de fotografia, então o que faz um diretor de fotografia? Grosso modo, o diretor de fotografia é quem lida com tudo relacionado à luz e câmera. Ele orienta os trabalhos dos eletricistas, maquinistas, operadores e assistentes de câmeras, iluminadores, e trabalhar em conjunto com a parte que nos toca a respeito de diretores, cenógrafos e diretores de arte, figurinistas e produtores.

De acordo com o livro “50 anos luz, câmera e ação” podemos resumir o básico da iluminação na fotografia em 3 partes: Ataque, Compensação em relação a esse ataque e Contraluz. Essas 3 subdivisões estão relacionadas a natureza e as localizações que serão posicionadas as luzes para a iluminação do assunto em questão.

A luz de ataque é normalmente representada por uma luz dura, ou seja, uma luz pontual. Esta é a luz “principal” que iluminará o ator/atriz. A função do ataque é dar relevo e para ter relevo, há de ter sombra, e essa é a principal característica de uma luz pontual, projetar uma sombra bem definida. É recomendado que seja usado apenas uma fonte de luz de ataque, se for necessário usar vários ataques, faça com que eles pareçam um só.

Já a compensação é uma luz difusa que tem como principal objetivo iluminar as sombras causadas pelo ataque. A gradação que se vai usar, a natureza e a intensidade dessa iluminação das sombras, é uma das grandes dificuldades e um dos desafios da fotografia. Um dos cuidados que se tem que ter com a luz de compensação é não causar uma segunda sombra no assunto, pois assim configurará como um segundo ataque ao mesmo.

A contraluz é uma luz pontual ou difusa que sempre será colocada na direção contrária da câmera. Ela foi criada com a necessidade de destacar o assunto com o cenário de fundo nos filmes em preto e branco, hoje, apesar das filmagens serem a cores, ainda é utilizado a contraluz, entretanto não mais por obrigação, mas como uma opção artística, por exemplo, ela é bastante usada para as tomadas noturnas para acentuar a silhueta do personagem e/ou definir uma sombra indo em direção a câmera.

Embora pareça simples esse modelo apresentado por Edgar Moura em seu livro, não se engane... o grande mistério/arte da fotografia é saber dosar com precisão a intensidade da luz e sua direção, sem contar a sua sensibilidade artística. Além do conhecimento técnico mostrado até agora, um diretor de fotografia precisa ter o conhecimento sobre os seus equipamentos, ou seja, ele deve saber os tipos de refletores, gelatinas, filtros, gruas, trilhos e demais equipamentos que ele pode utilizar para obter a fotografia que deseja.

Então é isso pessoal, segue ai a ideia geral do que é a fotografia dentro do universo do cinema. É importante prestar atenção nessas categorias mais técnicas, pois graças a eles nós podemos assistir essas obras de arte cinematográfica que tanto amamos.

Precisamos Falar Sobre o Benjamin

Benjamin, de três anos, sentou-se no chão do quarto para assistir ao Rambo matar vietnamitas. Na noite daquele dia, pediu ao pai que lhe comprasse um Revólver do Rambo, daqueles com espoletas. Benjamin não sabia bem se queria matar vietnamitas, mas queria uma arma. Seu pai, no fim de semana, apareceu em casa com algo muito melhor: além do revólver, ele trouxe o coldre da arma, um distintivo de xerife e um chapéu de cowboy. Benjamin agora sabia: queria matar índios.

Uma semana mais tarde, Benjamin foi à feira com a mãe. Ele adorava fazer o passeio, já que sempre voltava para casa com milhões de tangerinas e, às vezes, com um quilo da sua fruta favorita, a siriguela. Porém, dessa vez, na mente de Benjamin, não se tratava de um passeio seguido de compras, mas da escolta da primeira dama do condado, e a ele, o xerife, fora confiada a vida da mulher do prefeito. O menino, de chapéu na cabeça, andava devagar, as mãos na cintura, o olhar taciturno, um fio de mato na boca. Olhava desconfiado para os vendedores, encarava outras crianças e, se elas não percebessem a estrela dourada no seu peito, ele fazia questão de chamar a atenção para a arma na cintura.

Toda a seriedade se desfez quando Benjamin avistou, ao lado de uma cerca com patos, uma dúzia de gaiolas repletas de pintinhos. À postura de xerife seguiu-se o implorar de uma criança à mãe. Aos três anos de idade, Benjamin levava para casa seu primeiro bicho de estimação, um pintinho mais amarelo que o sol.

* * *

No sábado, Benjamin brincava na cama da mãe. O filhote de ave recém adquirido piava sem parar e o menino (ou melhor, o xerife) começava a se impacientar. “Mais um piozinho só e eu o coloco atrás das grade!”, alertou. Um pio foi o que ele obteve em resposta. Benjamin sacou o revólver e chamou a atenção para sua autoridade: “Eu sou o xerife aqui. E é pruibido piá.” Mais um pio. Seguido de outro e mais outro. A criatura debochava de Benjamin. Debochava da Lei. “Mais um pio. Só mais um. Mais um pio e eu MATO você.”, disse o xerife, engatilhando o revólver. O pinto encarou a arma e a criança atrás dela. “Pio?”.

A mulher do prefeito entrou no quarto e deparou-se com a seguinte cena: a cabeça do animal na cama, separada do corpo, que jazia no chão. Ficou claro que Benjamin não gastou uma bala sequer. Ele o fez com as próprias mãos.

* * *

Benjamin era um garoto comum. Ele amava o gato Tom e considerava o rato Jerry um sádico. Achava o Coringa um cara engraçado e o Batman (apesar de ser um sujeito legal) meio mal-humorado. O boneco Chuck (de Brinquedo Assassino) seria, para o pequeno Benjamin, o melhor presente de dia das crianças que ele poderia ganhar. Aos cinco anos, ele ganhou uma irmã.


Foi por pouco, mas ela passa bem.

DOCUMENTÁRIO POLÍTICO: FAHRENHEIT 11 DE SETEMBRO

Em Cabra Marcado Para Morrer, partilhamos da ótica de um cineasta brasileiro sobre um problema do Brasil, mesmo que num microcosmo deste problema. Agora, neste segundo filme do tema Documentário Político, vemos o diretor estadunidense Michael Moore contestar as decisões (e as amizades) do hoje ex-presidente George W. Bush.


Fahrenheit 9/11, 2004
Estados Unidos
dir.: Michael Moore

Há dez anos, Michael Moore entregava ao mundo um filme poderoso, que mostrava as repercussões dos atentados de 11 de setembro e as contraditórias atitudes tomadas pelo governo dos Estados Unidos a respeito. Mais: o filme colocava em xeque as motivações do próprio governo para as posteriores invasões do Afeganistão e Iraque, e ainda falava de ligações entre as famílias Bush e Bin Laden.

Antes de se consagrar vencedor da Palma de Ouro (o maior prêmio do Festival de Cannes), Fahrenheit 11 de Setembro sofreu alguns pequenos problemas para ser distribuído, já que sua distribuidora inicial, a Icon Productions, desistiu do trabalho alegando “conflitos de imagem”, e sempre negando a acusação de que estaria motivada politicamente.

O título do filme faz referência ao livro (e filme homônimo) Fahrenheit 451, uma distopia que se ambienta num mundo com um regime totalitário que queima todo e qualquer livro, sob o pretexto de impedir que as pessoas tornem-se infelizes e improdutivas.



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Músicas marcantes nos filmes

Como bom apreciador de música que sou, para meu texto mensal resolvi escolher 10 músicas de filmes que me marcaram de algum modo. Seja por uma cena, pela música ser chiclete, seja por eu gostar do(a) artista/banda ou o que for! Os filmes não são necessariamente musicais, e minha única regra aqui é colocar apenas músicas cantadas pelos personagens durante a cena, excluindo assim músicas de fundo e os temas sem letra, estilo a marcha imperial de Star Wars, o tema de Tubarão, a música que anuncia a chegada do Super-Homem etc. 

A onda aqui é ouvir e sair cantando, e não apenas cantarolando.

10) Across The Universe - All You Need Is Love

Em 2006 foi lançado esse filme, um musical apenas com canções dos Beatles. A história que não cativa muito, mais parece um bloco de vídeo clips unidos com um pouco de contexto entre um e outro. Mas a película não é de todo mal e traz belas interpretações de alguns sucessos do quarteto de Liverpool. Entre elas, a que encerra o filme, unindo novamente o casal Jude e Lucy, depois de passarem por alguns problemas no seu relacionamento.


9) Aladdin - Um Mundo Ideal

Quem nunca cantou essa música para sua(eu) namorada(o), tá perdendo uma boa oportunidade. Uma melodia linda, com uma letra pra deixar qualquer coração apaixonado derretido. Perfeita pra fazer um dueto com sua(eu) amada(o)!


8) The Wonders - That Thing You Do

Quatro amigos se juntam, montam uma banda e estouram no país todo com um hit, que por ironia, originalmente não era pra ter essa levada. Se você gosta de música, um dia já pensou em estar nessa situação. Além do mais, a música é tão chiclete que você vai passar o dia cantando-a. Ouça-a por sua conta e risco...


7) O Homem do FuturoTempo Perdido

Antes de cantar no MTV ao Vivo Tributo à Legião Urbana, de 2012, Wagner Moura já havia experimentando a sensação de cantar uma música da banda para uma platéia em O Homem do Futuro, de 2011. No filme João Zero (Wagner) e Helena (Alinne Moraes) cantam numa festa da faculdade, onde o "João do futuro" tenta salvar o "João do passado" de uma humilhação na frente de todos. A versão ficou muito boa, não comprometeu em nada! Será que foi daí que Dado Villa-Lobos e Marcelo Bonfá tiraram a ideia de chamar Wagner para cantar no tributo?


6) Moulin Rouge - El Tango de Roxanne

Esse clássico do The Police foi recriado de uma forma que arrepia qualquer um que assistiu Moulin Rouge. Na cena, Christian (Ewan McGregor) caminha inconsolado no salão do clube enquanto sua amada Satine (Nicole Kidman) é obrigada a se submeter aos prazeres do Duque de Monroth (Richard Roxburgh). Enquanto isso, a cena de canto e dança é interpretada pelos bailarinos, que mostram como é difícil amar a mais famosa cortesã do Moulin Rouge. A cena fica mais impactante ainda com os cortes para a cena em que Satine está com o Duque. 
OBS.: Vai um mérito mais que honroso também para a encenação de The Show Must Go On.


5) Curtindo a Vida Adoidado - Twist And Shout

Você pode até ser de outro planeta e não conhecer nada sobre Beatles, mas com certeza vai reconhecer essa música. Afinal, quem não lembra dessa cena clássica do cinema, onde temos Ferris Buller (Matthew Broderick) cantando-a, no meio de uma parada da cultura alemã, em plena Chicago? Com certeza, você já viu muitas vezes essa cena na Sessão da Tarde...


4) O Rei Leão - Hakuna Matata

Eu poderia colocar no mínimo umas 3 músicas d'O Rei Leão nessa lista, pois talvez seja o filme da Disney com as melhores músicas que já tem. Mas pra não ficar meio monopolizada a lista, escolhi a que eu acho mais clássica de todas. Todo mundo que ouve "Hakuna Matata" remete logo à dupla Timão e Pumba. Quem nunca saiu cantando "Os seus problemas... você deve esquecer..." que atire a primeira pedra!


3) Grease - Greased Lightning

Tá... eu sei que tem músicas mais famosas do filme, como Summer Nights e You're The One That I Want, mas eu particulamente tenho essa como a minha preferida. Nela, John Travolta pode mostrar todo seu gingado e rebolado sendo o protagonista da cena, tendo os holofotes todos voltados para ele, usando seu carro como aparato para seus passos. Destaque para sua descida montado no motor, que é ótima!


2) Moonwalker - Smooth Criminal

O filme é um lixo, totalmente sem pé nem cabeça: isso é fato. Mas seu ponto forte - que vale pelo filme todo - é a cena no bar, a qual Michael Jackson canta e dança Smooth Criminal. MJ pode ser um péssimo ator, mas nessa versão full da cena, "the king of pop" mostra o porquê ele ganhou esse apelido, usando e abusando de todo seu arsenal de movimentos e passos que ficaram eternizados na mente de todos. Podemos discutir sua qualidade atuando, mas na música e na dança, não há discussão: seu legado será eterno.


1) De Volta Para o FuturoJohnny B. Good

Sou suspeito para falar desse filme, pois tá no meu top 3 de filmes favoritos. Além do mais, não tem como pelo menos bater o pé no ritmo da música e se envolver por um contagiante Marty McFly deixando todos pasmos com sua apresentação no Baile Encantamento do Fundo-do-Mar.
Apesar de parecer, Michael J. Fox não toca guitarra na cena, ele apenas aprendeu como simular todos os acordes, inclusive a parte de trás da cabeça. O jornal Daily Mail disse que o ator gostou tanto da cena que aprendeu a tocar guitarra de verdade, e em 2011, mais de 26 anos depois do lançamento do filme, Fox recriou a cena, agora tocando de verdade. Cena antológica do cinema. 



E aí... sua lista é diferente da minha? Comente qual é seu Top 10! Compartilhe com seus amigos e debatam quais as músicas mais legais!!

DOCUMENTÁRIO POLÍTICO: CABRA MARCADO PARA MORRER

Um documentário que teve suas gravações interrompidas durante 17 anos. Esse é o primeiro filme o qual iremos falar sobre o tema Documentário Político: Cabra Marcado Para Morrer.


1984
Brasil
dir.: Eduardo Coutinho

Eduardo Coutinho era paulista, nascido em 1933. Seus primeiros documentários foram realizados na França, onde foi estudar direção e montagem, graças ao dinheiro de um prêmio ganho respondendo um quiz sobre Charles Chaplin. Ao voltar ao Brasil em 1960, ingressou no Centro Popular de Cultura da União Nacional dos Estudantes, e foi escalado para dirigir a segundo produção do centro, justamente Cabra, talvez seu trabalho mais expressivo. Eduardo dirigiu outros documentários, entre eles Santo Forte (1999) e Babilônia 2000 (2000), premiados em festivais nacionais, como o Festival de Gramado, o qual inclusive lhe concedeu o Kikito de Cristal pelo conjunto da obra, em 2007. 

Cabra Marcado Para Morrer conta a história do assassinato de João Pedro Teixeira, líder das Ligas Camponesas, através dos próprios participantes do caso: os Camponeses do Engenho Caranéia, inclusive a sua viúva, Elizabeth Teixeira, que faria o seu próprio papel. Entretanto, com duas semanas de filmagens, a produção do filme foi interrompida por causa do Golpe Militar de 1964, sobre a acusação de comunismo da equipe: alguns membros foram presos e parte de câmeras e filmagens tinham sido destruídas.

Porém, 17 anos depois da interrupção, o trabalho foi retomado por Eduardo, graças à preservação de parte do material antigo, seja escondido em latas embaixo da cama ou negativos guardados com outro nome. O diretor entrevistou os mesmos camponeses que participaram da primeira parte das gravações, inclusive Elizabeth, que estava escondida em São Rafael, interior do estado do Rio Grande do Norte.  O filme ficou pronto 3 anos depois - 20 anos após o início do projeto - e recebeu 12 prêmios em festivais internacionais, entre eles Berlim, Paris e Rio de Janeiro.


E aí, ficou curioso pra saber o que tanto a Ditadura viu de comunista nesse filme? Pois assista também e compartilhe conosco o que você achou dele! Compartilhe esse post com seus amigos e vamos debater...

... antes que o governo nos proíba disso!

A morte em Harry Potter

Atenção! O texto a seguir está repleto de spoilers!


Lord Voldemort é um bruxo das trevas, habituado a tudo que há de mais perverso. Assim, é curioso que aquilo que ele mais tema seja justamente morrer. Essencialmente, todas as atitudes do vilão (e seu desejo por poder) estão ligadas à sua completa obsessão em suplantar a condição mortal. Para tal, inclusive, ele acaba recorrendo à própria morte como arma. Ele mata para fragmentar sua alma, em busca da imortalidade. Mata um casal, cujo bebê lhe representava uma ameaça. E mata para controlar a Varinha das Varinhas – também chamada “Varinha da Morte”. Morte, morte e morte mais uma vez. Se há um tema central em Harry Potter, este não é a magia.

Em dado momento do filme Harry Potter e a Pedra Filosofal, o jovem Harry encara, pela primeira vez – e graças a um espelho mágico -, os rostos dos pais que ele jamais conhecera. Sua história, inclusive, começa alguns anos antes disso, quando ele se torna célebre ao sobreviver à temível Maldição da Morte, na mesma noite em que fica órfão.

O tema “morte” surge em Harry Potter ilustrado das mais variadas formas. No âmbito literal, já somos introduzidos na saga do menino bruxo com a notícia do homicídio do casal Potter e com o tema da orfandade. Mais tarde, nos deparamos com a morte de um amigo e com a perda repentina de Sirius Black, padrinho do protagonista. Até mesmo a eutanásia do professor Dumbledore é mais que apenas sugerida em certo ponto. Nos dois últimos filmes, a fatalidade atinge os dois lados da batalha, tornando-se ainda mais incessante, e o sacrifício final de Harry, como último recurso para derrotar o vilão, ainda faz rima com aquele enfrentado pelos seus pais para salvá-lo.

Todos os signos encontrados nos filmes da franquia são, obviamente, oriundos dos livros nos quais são baseados. Por isso mesmo, é realmente recompensador para o leitor encontrá-los na tela, transcritos de maneira tão bem feita e atenciosa aos detalhes, já que a morte também se manifesta de maneira simbólica: Dumbledore (personagem de Sir Michael Gambon) surge usualmente representado num figurino de tons de roxo, que, assim como o verde do Avada Kedavra, é uma cor normalmente atribuída à morte. A figura de capuz e foice, aliás, praticamente ganha forma em Harry Potter e as Relíquias da Morte – Parte 1, na passagem em que, numa animação impecável, Hermione narra o Conto dos Três Irmãos (fábula que, claramente, trata da busca humana em refrear a mortalidade e as dores decorrentes da mesma).

Em tempos em que a morte e o genocídio nas batalhas de blockbusters passam quase que despercebidos, em Harry Potter e as Relíquias da Morte - Parte 2 há um momento em que as perdas são encaradas, para serem então sentidas e refletidas. Coisa aparentemente esquecida em filmes como Superman - Homem de Aço, Círculo de Fogo e toda a franquia Transformers, onde verdadeiras hecatombes são provocadas e as milhares de vidas perdidas sequer são mencionadas, o que traz uma dose muita alta de artificialidade a um clímax que, supostamente, deveria ter algum peso dramático.

Lord Voldemort, cujo nome em francês significa "Voo da Morte" (querendo dizer algo como "Escape/Fuga da Morte"), tem estampado em seu rosto ofídico o resultado de uma vida tentando renegar esta característica tão intrínseca à humanidade. Harry Potter, em suma, é uma série que nos impreciona e impacta com uma mensagem sobre a finitude da vida, e de como a concepção desta realidade (chorada e aproveitada do jeito certo e com as pessoas certas) é o que nos faz tão humanos.


Em memória de Jailson Xavier. Nem tão fã de Harry Potter, mas apaixonado pela Emma Watson. Primo, amigo, irmão.

DOCUMENTÁRIO POLÍTICO

Das séries sobre a vida animal do Discovery aos simplórios makings of de filmes, a retratação da realidade contida no gênero documental sempre me fascinou. Claro que eu nunca fui inocente ao ponto de pensar que essa retratação significasse a realidade real, por assim dizer, já que muito do que eu consumia envolvia estegossauros (e, mesmo criança, eu sabia que colocar um lagarto gigante ao lado de uma câmera Panasonic AVCCAM era uma coisa relativamente difícil de acontecer). No entanto, a simples ideia de que pudesse ser real já me valia uma experiência e tanto.

Mais tarde, ao desenvolver um senso crítico maior a respeito daquilo que me cercava e daquilo que assistia, também me dei conta de que até mesmo os documentários históricos se tratam de uma representação subjetiva da realidade, baseada na visão que o diretor quer empregar ao filme. E, embora o próprio termo documentário se refira a algo “que tem caráter de documento”, ainda hoje existe uma indefinição muito grande acerca do que separa verdadeiramente o documentário do cinema de ficção. O que nos leva ao tema do mês, sobre Documentários Políticos.

Obras sobre política podem seguir certas ramificações, como bem podemos imaginar: elas podem tratar das biografias de políticos, do passo a passo de eleições específicas (e seus candidatos), escândalos, golpes de estado, ditaduras e conspirações, ou mesmo uma crítica ao sistema de saúde ou imigração. São inúmeras as abordagens que um documentário político pode tomar. Seguem alguns exemplos:

  • Bolívia (Bolivia, 2001, Argentina, dir.: Adrián Caetano), sobre a discriminação sofrida pelos imigrantes bolivianos no resto da América Latina.
  • Fahrenheit 9/11 (2004, EUA, dir.: Michael Moore), sobre as causas e consequências dos atentados de 11 de setembro de 2001.
  • Dossiê Jango (2013, Brasil, dir.: Paulo Henrique Fontenelle), sobre as estranhas circunstâncias da morte do presidente João Goulart, expulso do cargo após o golpe de Estado de 1o de abril de 1964.
  • Cabra Marcado para Morrer (1984, Brasil, dir.: Eduardo Coutinho), sobre a vida de João Pedro Teixeira, líder camponês assassinado em 1962, através das palavras de sua viúva, Elizabeth.
  • A Batalha do Chile (La Batalla de Chile, 1979, Chile, dir.: Patricio Guzmán), trilogia sobre o golpe de 1973. É tido como um dos maiores e mais impactantes documentários políticos já feitos.
  • A Corporação (The Corporation, 2003, EUA, dir.: Mark Achbar / Jennifer Abbott), sobre o poder das corporações no mundo moderno, através da mídia e das instituições.

Ao admitir a discussão sobre o que é realmente de caráter político ou não em filmes que não tratem do tema "estatal", o Documentário Político não fica, consequentemente, restrito a este campo. Quebrando o Tabu (de Fernando Grostein Andrade), por exemplo, lida com a temática de combate às drogas e acaba por tratar de política. Assim como o recente Elena (de Petra Costa), ao "discutir temas tabus do universo feminino e da saúde mental".

A política é vastíssima. O universo documentável é infinito.

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